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Equipe da LBV sofre acidente de avião em Minas Gerais. O que houve naquele vôo?

Na quinta feira, dia 9 de dezembro de 2010, uma aeronave transportando uma equipe da LBV de Vitória para Brasília, um vôo de 1.236 Km, onde cobririam um evento de entregas de cestas básicas em uma campanha de natal da LBV, caiu na região do Vale do Rio Doce, próximo à zona rural de Bom Jesus do Galho, em Minas Gerais.

A aeronave com capacidade para 6, transportava 5 pessoas, sendo: uma repórter de 35 anos, um cinegrafista de 25 anos, um fotógrafo de 26 anos, um diretor executivo, todos da LBV, além do piloto de 40 anos. No acidente 3 passageiros morreram na hora, o piloto – com 80% do corpo queimado – morreu no hospital após 3 dias. Apenas o diretor da LBV sobreviveu e permanece internado, em estado grave, no Hospital Albert Einstein em São Paulo.

Eles decolaram do Aeroporto de Vitória às 18h31, desta quinta-feira (9), com destino a Brasília. Reportagem do G1 indica que a primeira chamada recebida pela polícia foi às 19h45. Ou seja, a queda se deu após aproximadamente 1h de vôo. O estado das vítimas carbonizadas indica que um grande incêndio ocorreu após a queda, que denota a existência de combustível eliminando a hipótese de pane seca.

PT-LEU Cenipa retira motor esquerdo
PT-LEU Cenipa retira motor esquerdo - FOTO do http://g1.globo.com/

Da fotografia acima, observada no site do G1, se depreende que as pás de hélice do motor não se retorceram após a queda. Além disso, deste ângulo da foto as hélices parecem estar em bandeira (posição de motor cortado, onde a pá de hélice fica na posição perpendicular ao vento para evitar atrito). Ou seja, não colidiram com o terreno funcionando e, portanto, o motor poderia estar inoperante (cortado pelo piloto) no momento do acidente. Também explica o interesse do CENIPA por analisar melhor este motor (esquerdo).

O avião foi cedido à LBV pelo advogado paulista Márcio Pollet, colaborador da instituição. Segundo Pollet, o avião passou por revisão na semana passada. O PT-LEU era um bimotor a pistão, do fabricante americano Beechcraft, modelo Baron B-55, registrado para uso privado (TPP – sem venda de passagens ou cobrança pelo vôo), de prefixo PT-LEU, com capacidade para transportar 1+5. O Baron é um variante do Bonanza, e começou a ser fabricado em 1961. Voa em média à velocidade de cruzeiro de 350km/h, numa altura de 2.100m. Seus tanques carregam entre 440 e 515 litros de combustível (gasolina de aviação), tendo autonomia média de 1.746 Km.

O fato do acidente ter acontecido após 1h de vôo, com aproximadamente 329 Km de distância, que representam 27% do trajeto, e por isso já havendo consumido boa parte do combustível. Além de estar levando uma pessoa a menos do que a sua capacidade máxima, também revelam que o peso não parece ser fator contribuinte para este sinistro.

A princípio justifica-se uma análise mais apurada de porque o motor esquerdo fora supostamente cortado pelo piloto antes da queda. E qual foi a revisão que a PT-LEU efetuou há uma semana? No entanto, sabemos que com apenas um motor é possível voar no Baron para retornar a uma pista de pouso em segurança.

Então, porque o avião caiu se ainda tinha um motor, combustível suficiente e peso suportável? Precisamos analisar algumas hipóteses, entre as quais se houve Stall (Estol), que é a perda de sustentação da aeronave pela velocidade mínima da aeronave, que no caso do Baron é 135km/h. E qual era a meteorologia no momento do acidente.

Portanto, uma hipótese razoável a ser verificada com cuidado, utilizando-se as poucas informações que temos até aqui, seria: a perda de um motor por alguma pane, seguindo-se da perda de sustentação (estol) por imperícia do piloto ou por condições meteorológicas adversas.

Uma segunda hipótese possível: CFIT – Collision Flight Into Terrain, que traduzindo seria a colisão com o terreno de um vôo controlado. O terreno era montanhoso, era noite e a visibilidade poderia estar prejudicada. A perda de um motor somada a uma falha do piloto pode ter causado a perda de altitude e conseqüente colisão.

Uma terceira hipótese seria de que o piloto tentou o pouso em uma fazenda, mas não obteve sucesso nesta operação. Problemas mecânicos podem explicar a necessidade deste pouso de emergência. Um motor em pane e o outro com algum problema? Talvez, por isso neste caso, será preciso verificar qual foi a revisão feita no avião.

É fundamental descobrirmos o que houve para aprendermos de forma que não se repita um acidente igual a este. O relatório preliminar do CENIPA sai em 30 dias, e a análise completa deste órgão em aproximadamente 1 ano. A propósito, o CENIPA é um órgão sério, que precisa do nosso apoio para que permaneça investigando todos os acidentes aéreos, civis e militares, com independência sobre qualquer Ministério ou Agência.

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Três anos do Acidente do vôo 3054 da TAM: Afinal o avião estava tão cheio que transportava gente em pé?

Em primeiro lugar, é fundamental destacar que o Brasil é signatário de Tratados internacionais onde assume a responsabilidade, de manter um órgão de investigação aeronáutica – o CENIPA (Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes) – que tem o caráter de prevenir acidentes em detrimento de apontar culpados. A OACI (Organização da Aviação Civil Internacional, ICAO em inglês), que é um órgão pendurado nas Nações Unidas, há muitos anos, entendeu que apontar culpados impede que futuras investigações tenham um bom resultado ao dificultar a colaboração de todos envolvidos. E, portanto, não contribui com a prevenção de acidentes que é um bem maior à sociedade.

Dito isso, vamos tratar do Relatório Final do CENIPA, de número A-67 de 2009, publicado em 27/10/2009, que possui 122 páginas (contando anexos e capa), que aponta os fatores contribuintes para o acidente com o avião A320 da TAM, voo 3054 do dia 17 de julho de 2007, que colidiu com um depósito da TAM após não conseguir pousar na escorregadia pista de Congonhas.

1. Apesar de classificar como “fator contribuinte indeterminado”, pelas suas recomendações finais e o próprio texto, está implícito no relatório que houve falha dos pilotos com a posição das manetes para pouso com o reverso pinado (o reverso é usado na turbina, ao pousar, para alterar o fluxo do ar dentro da turbina, e assim desacelerar o avião). O reverso do motor de número 2 estava travado ou pinado havia 4 dias (desde 13 de julho).

2. O Relatório faz menção a uma falha da ANAC, à época tendo a Sra. Denise Abreu como diretora, pela “inadequação ou ausência de normas” – desde abril de 2006 – exigindo o reverso ativo para operações de pouso em Congonhas (uma pista curta). Este problema fora resolvido apenas em maio de 2008. O Relatório não menciona mas foi divulgado que o Aeroporto de Congonhas operava sob liminar da Justiça de São Paulo para pousar aviões sem o grooving (ranhuras para escoar a água e ampliar o atrito do asfalto) da pista, bem como sem reverso, e que parece ter documentos falsos entregues pela ANAC ou pela Infraero ao Juiz que havia dado a liminar. Fato seríssimo, porém, não tratado neste Relatório por não ser escopo do mesmo.

3. Outra questão importante é que o Relatório do CENIPA aponta que a utilização de dois comandantes no mesmo voo prejudica a “troca” adequada de informações entre os pilotos, pois haveria uma complacência entre eles, o chamado gerenciamento de recursos da cabine. Na escuta do CVR (caixa preta de voz) percebe-se que não houve briefing (discussão resumida da tarefa) do pouso em Congonhas, que é um procedimento padrão em todos os pousos. O Relatório também classifica como indeterminado a ansiedade dos pilotos como “pano de fundo” dos pousos em Congonhas. E que um dos comandantes (comandante de jatos menores), atuando como co-piloto (SIC) quase não tinha experiência de voo no A320 (237 horas).

4. O CENIPA também fez uma recomendação à EASA (European Air Safety Administration) para que esta verificasse junto a AirBus a instalação de um alarme para avisar aos pilotos sobre o uso correto das manetes – inclusive quando reverso estiver pinado – para o pouso. Um dos manetes supostamente estaria em CL quando deveria estar na posição IDLE.

5. Sobre a pista contaminada de Congonhas, o Relatório não coloca nem como fator contribuinte indeterminado, muito embora faça uma série de recomendações de obras na pista à Infraero, entre as quais exige uma área de escape, ainda que isto reduza seu comprimento. Esta recomendação data de 17 de setembro de 2007. A pista de Congonhas, segundo o documento aqui analisado, não está de acordo com o Anexo 14 da ICAO, em conformidade com o padrão RESA – Runway End Safety Área. É muito difícil para analistas de riscos aeronáuticos explicar ao seus pares do mercado de seguros aeronáuticos, que o nosso principal aeroporto (o mais usado) não tem esse padrão internacional apesar de sermos signatários desses Tratados. Obviamente que esse “Risco Brasil” recai sobre as taxas dos seguros de todas as aeronaves que aqui operam.

6. Um ponto relevante do Relatório, que gera uma certa confusão, trata do número de pessoas à bordo da aeronave. No item 1.2 Lesões Pessoais, mostra 6 tripulantes e 181 passageiros que faleceram dentro do avião. Ou seja, um total de 187 pessoas dentro da aeronave, não estou considerando as 12 vítimas que estavam fora da aeronave, no galpão da TAM.

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Em outro ponto, no item 1.6 Informações da Aeronave, aponta que o avião estava registrado e desenhado para transportar 11 tripulantes e 174 passageiros, ou seja, um total de 185 pessoas. Aqui considerando que os dois jump-seats (banquinho desmontável dentro da cabine dos pilotos), e todos os assentos de tripulantes estavam ocupados! Como grande parte dos passageiros (18) era de funcionários da própria TAM, parte destes – 5 pessoas – se sentaram nos 11 assentos de tripulantes.

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Se o avião estava completamente lotado com todos os seus 185 assentos, como as vítimas contabilizam 187 pessoas? Havia 2 pessoas em pé no avião? Além de ser contra normas aeronáuticas, RBH 121, denota indícios de excesso de peso. Será que o Relatório do CENIPA se enganou no número de vítimas no solo? Seriam 14 e não 12? Deixando a aeronave com seus 185 lugares preenchidos. Havia no CVR (caixa preta de voz) sinais de que na cabine viajam 4 tripulantes, 2 pilotos e 2 funcionários nos jump-seats?

Porque o peso é importante? Porque essa questão é relevante após 3 anos? Por que o comprimento da pista necessário para se pousar um avião depende de inúmeros fatores: vento e posição do vento, peso da aeronave, tipo da aeronave, reversos ativos ou não, qualidade do atrito da pista, altitude, se a pista está seca ou molhada, entre outros pontos.

Um A320 necessita – em média – 1.540 metros para frear. Congonhas possui 1.940 metros. Quando o avião não possui o reverso necessita outros 55 metros conforme manual da Airbus. Os outros 300 metros que restam aqui podem se perder em função do peso, vento e condições da pista. Isso é muito sério, pois eliminaria como hipótese principal, o simples erro dos pilotos nas manetes.

Qual foi o abastecimento em Porto Alegre, onde o ICMS do combustível é muito menor que em São Paulo? Calculando o combustível remanescente de voos anteriores, bem como o consumo até Congonhas, quanto sobraria no momento do pouso? Qual o peso de combustível, bagagem, carga e passageiros? Boas investigações são feitas com boas perguntas. Essas ainda não foram respondidas.

Ressalto aqui que o CENIPA é um órgão isento, sério, de reputação ilibada. Conheço bem seu trabalho sem o qual nosso índice de acidentes estaria elevado. E certamente este Relatório enfrentou muitas dificuldades, com pressões ou questionamentos do Governo, Ministério da Defesa, ANAC, Seguradora da TAM, Seguradora da Infraero (se há), Infraero, entre outros stakeholders. Mas, sempre tem um mas, o avião estava com gente em pé ???