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Perguntas e Respostas sobre catástrofes das Tempestades Tropicais ( Chuvas )

PARA NÃO CHORARMOS NOSSOS MORTOS A CADA VERÃO! Países que possuem convulsões da natureza, tais como terremotos, furacões, vulcões, entre outros, incluindo países em desenvolvimento como o Chile, possuem uma forte preocupação com gerenciamento de riscos (prevenção treinamento, resgate de vítimas) para se preparar para enfrentar esses fenômenos. O Brasil possui tempestades tropicais, e diante do aquecimento global espera-se que estas sejam cada vez mais fortes,  e portanto, deveríamos nos preocupar mais com isso!

1) Era possível prever ou evitar as perdas materiais e de vidas observadas nesta catástrofe que ocorreu na Região Serrana do Rio de Janeiro, em janeiro de 2011?
2) O que é e como funciona um Plano de Contingência ou Emergência?
3) Gerenciamento de Crise: o que é preciso e possível fazer neste momento de crise, considerando o que está acontecendo agora?
4) No momento que a crise passar, quais as medidas de gerenciamento de risco são necessárias para se evitar a repetição deste acidente?
5) Qual a complexidade de se remover as pessoas de áreas de risco?
6) Qual a estimativa de prejuízos desta catástrofe na Região Serrana?
7) O que faz um gerente de riscos?

1) Era possível prever ou evitar as perdas materiais e de vidas observadas nesta catástrofe que ocorreu na Região Serrana do Rio de Janeiro, em janeiro de 2011?

Não era possível prever que a cidade de Nova Friburgo, por exemplo, receberia 290 mm de chuva ( o equivalente a 106 piscinas olímpicas) em um único dia, mesmo com a ajuda da previsão de radares meteorológicos. Quando a série histórica (segundo Weather Channel Brasil) é de 208mm para todo o mês de janeiro naquela cidade, sendo dezembro o pior mês de chuvas na cidade de Nova friburgo.

No entanto, os radares meteorológicos – sobretudo do Inmet – avisaram à Defesa Civil do Estado do Rio de Janeiro que chuvas fortes eram esperadas na região serrana. E por uma falta de comunicação o alerta não chegou à Prefeitura de Nova Friburgo, conforme se depreende da matéria jornalística do Jornal Extra do dia 14 de janeiro de 2011.

Além disso, se houvesse uma descentralização da Defesa Civil através de NUDEC´s (Núcleos de Defesa Civil) treinados e equipados, aliado a um bem organizado e planejado Plano de Contingência, certamente não teríamos a quantidade de vítimas observadas.

Os trinta anos de descaso e falta de planejamento urbano gerou diversas comunidades – com elevada densidade demográfica – residentes em áreas de risco. E por isso, não haveria como se evitar as perdas materiais. Defendo a remoção das pessoas de áreas de risco, como única solução para se evitar acidentes desta natureza. Obviamente a remoção é uma solução de longo prazo, pois depende de planejamento urbano, infra-estrutura de hospitais, escolas, transporte e lazer para trazer uma solução definitiva.

Concluindo, as perdas materiais – dado o cenário em que se encontra a maioria das cidades brasileiras – não teriam solução de prevenção sem a remoção. Mas muitas vidas poderiam ter sido poupadas se houvesse um Plano de Contingência para situações de alertas e que o resgate fosse mais ágil e eficiente. Afinal essa era mais uma “tragédia anunciada”, vale lembrar que as cidades serranas do Rio de Janeiro receberam o mapa de risco de suas regiões entre os anos de 2006 e 2007. Ou seja, houve tempo razoável para algumas remoções e sobretudo para a criação de um plano de emergência para salvar aquelas pessoas que residem em áreas de risco.

2) O que é e como funciona um Plano de Contingência ou Emergência?
Plano de Contingência ou de Emergência tem o objetivo de minimizar perdas, evitando o agravamento das perdas materiais e de vidas. Ele consiste em ações que iniciam diferentes processos em rede. E planejam previamente quais os recursos, equipamentos, mão-de-obra serão utilizados em cada caso, bem como qual será a sua origem (fornecedor), transporte, tempo de chegada, enfim a logística para a mobilização de todos os recursos necessários para resgatar e salvar vidas.
 
Por exemplo, uma liderança treinada residente da área de risco, a partir de um alerta de chuva após uma quantidade X de milímetros, poderia ser responsável por levar as pessoas para um abrigo previamente estudado e com área suficiente para receber os desalojados (ginásios e escolas). O transporte até o abrigo também é planejado antes, podendo haver pontos seguros de espera pelo transporte. Comunicação, alimentos, materiais de higiene e limpeza também são previstos no abrigo. Quanto às vítimas também há um estudo de como serão resgatadas, onde serão atendidas, para qual hospital serão levadas.
 
No caso de um acidente mais grave, como ocorrido na região serrana. A comunicação desde a origem poderia iniciar uma rede de apoio ainda maior incluindo exército, marinha e aeronáutica que possuem pontes desmontáveis, hospitais de campanha, helicópteros, etc.
Um plano de contingência evitaria levar vítimas para um hospital sem condições de atender, sem médicos, sem raioX, etc. Também evitaria que demorasse muito tempo para se chegar o resgate. O próprio planejamento ajuda a indicar falhas no sistema de Defesa Civil, como falta de equipamentos, veículos, má distribuição dos recursos pela cidade atrasando sua chegada aos locais afetados, falta de pessoal, falha na comunicação, entre outros. E assim, contribui para seu aperfeiçoamento.
O plano de emergência deve prever opções alternativas para cada etapa, ou seja, na ausência de telefones onde conseguir radio amadores, na falta de luz onde conseguir velas e lanternas, diferentes locais onde encontrar equipamentos de resgate (macas, pás, capacetes, botas, etc.). E o plano precisa ser atualizado de tempos em tempos. O treinamento – de primeiros socorros, de resgate, e explicando o plano de emergência – constante do pessoal envolvido, sobretudo palestras aos moradores de áreas de risco também é fundamental.
 
É muito importante que uma liderança local de uma NUDEC (Núcleo de Defesa Civil) possa iniciar – a qualquer hora, mesmo de madrugada – todo o plano, não dependendo de uma autoridade para iniciar a mobilização. A palavra prevenção só se encontra na legislação do Corpo de Bombeiros no caso de incêndio, enquanto desabamentos e enchentes são tratados reativamente – “prestar socorro e salvamento” – até na lei. Prevenção também passa por um Plano de Contingência.
 
Vista da cidade de Areal na Região Serrana
Foto de Aluízio Freire para o G1 – Areal onde um alerta primário e rudimentar salvou muitas vidas
 
 
3) Gerenciamento de Crise: o que é preciso e possível fazer neste momento de crise, considerando o que está acontecendo agora?
 3.a) as pessoas que residem nas cidades afetadas evitarem sair de casa, fazendo isso apenas quando estritamente necessário: casos médicos, compra de alimentos, etc. Exceto aquelas que se destinam a colaborar no resgate, organização e distribuição de doações, etc.
3.b) as demais pessoas de outras regiões podem doar alimentos, remédios e até sangue para essas cidades destruídas;
3.c) os residentes de áreas de risco não podem voltar para suas casas – aquelas que ainda não desabaram – sob pena de que novos escorregamentos de terra aumentem o número de vítimas;

3.d) que as pessoas envolvidas no resgate e reconstrução da cidade utilizem equipamentos de proteção individual (luvas, botas, capacetes). Evitem contato com água e lama que podem estar contaminadas. E quando retornarem as suas residências ou bases que tomem banho e tenham cuidados de limpeza e higiene incluindo suas roupas;

3.e) que o governo vacine a população. Após essas tragédias há riscos de epidemias de lepitospirose, hepatite A e doenças diarréicas.

3.f) que os mortos sejam enterrados para evitar-se a propagação de doenças.

3.g) governos nas três esferas precisam liberar recursos e apresentar projetos de reconstrução de casas populares, para que o tempo nos abrigos seja transitório e curto. Caso contrário novas favelas irão se formar justamente em áreas de risco.

4) No momento que a crise passar, quais as medidas de gerenciamento de risco são necessárias para se evitar a repetição deste acidente?

Simplesmente fazendo gerenciamento de riscos. Há recursos de pessoal capacitado, há tecnologia e acesso a softwares modernos no Brasil, para se gerenciar este risco, através das seguintes etapas:

a) identificação dos perigos – através de mapas de risco e levantamento de falhas regionais que precisam ser atualizados constantemente
b) análise de perigos – através da avaliação técnica com ferramentas matemáticas para apontar a probabilidade e severidade de cada risco levantado
c) tratamento dos perigos – através de plano de contingência integrado, da remoção de residentes de áreas de risco, do treinamento de equipes e criação de NUDEC´s, equipando Defesa Civil e Bombeiros.

5) Qual a complexidade de se remover as pessoas de áreas de risco?

A Constituição Federal prevê o direito por usocapião após a residência por mais de cinco anos. Ou seja, nas cidades do Rio de Janeiro e São Paulo, será um problema mais complexo de se resolver. Porém em áreas como Nova Friburgo e Teresópolis, a grande maioria das áreas de risco estão em áreas de preservação ambiental onde não há a possibilidade do usucapião. Outra questão trata da margem de rios, dependendo da largura do rio também há restrições para a construção às suas margens através de lei federal. Ou seja, há possibilidade de remoções imediatas, em outros casos há uma dificuldade legal.

Além disso, não se trata apenas de um embróglio jurídico, mas essas remoções poderiam ser voluntárias se houver investimento do poder público na infra estrutura (escolas, transportes, hospitais, etc.) atendendo as áreas que se pretende realocar as pessoas.

 

6) Qual a estimativa de prejuízos materiais e financeiros desta catástrofe na Região Serrana?
A maioria dos danos às estradas, segundo o DNIT,  foram a obstrução das vias pelo deslizamento de encostas. A Concessionária CRT, que administra a BR 116, teve deslizamentos sobre a pista interditando via no trecho entre Além Paraíba e Teresópolis (Km zero ao Km 89). No entanto, aparentemente não houve danos significativos na via que levem a grandes obras de recuperação. A Teresópolis – Itaipava, ou BR 495 está interditada no Km 24 por queda de barreiras. A Rio-Juiz de Fora, BR 040 administrada pelo CONCER, não apresenta danos graves exceto em Pedro do Rio, no Km 43, que tem tráfego em meia pista. Já nas rodovias estaduais, administradas pelo DER-RJ, equipes atuam nas rodovias RJ-130, RJ-142, RJ-148 e RJ-150, removendo barreiras, limpando pistas e refazendo trechos danificados. Os maiores danos serão absorvidos pelo Estado do Rio de Janeiro, nas RJ-130 e RJ 148 que apresentam erosão na pista, bem como inúmeros trechos apresentam danos a pontes nas RJ-134, RJ-146, RJ-172.  A Concessionária Rota 116 que administra a Estrada RJ-116 que liga Itaboraí à Macuco, passando por Cachoeiras de Macacu, Nova Friburgo e Bom Jardim, teve pequenos danos tais como uma ponte na entrada da cidade de Bom Jardim e um buraco na pista na altura de Mury próximo à Friburgo. Em suma, com as informações que temos até o momento, os prejuízos não são tão relevantes nas estradas que embora estejam na sua maioria bloquedas, não se supõe que demandem grandes obras. Além disso, a reconstrução de vias e pontes, segundo a Defesa Civil, deve atingir no máximo R$ 100 milhões.
 
A Associação de Hotéis do Rio de Janeiro estima que o prejuízo da Região Serrana com o cancelamento do turismo na região chegue a US$ 30 milhões. O Prefeito de Teresópolis, Mauro Jorge Sedlacek, estima que será necessário R$ 580 milhões para reconstruir a cidade. A Prefeitura de Nova friburgo estima o prejuízo em R$ 1 bilhão. O gerente de riscos pode utilizar-se de técnicos diversos tais como: geólogos, médicos, advogados, operadores de determinado equipamento, técnicos em geral, engenheiros, etc. Ele utiliza-se ferramentas que geralmente necessitam de muita matemática, tais como HAZOP, Árvore de Falhas, Árvore de Eventos, Análise Preliminar de Perigos, What-if, etc.  Também costuma entrevistar muitas pessoas e acumular dados gerenciando muita informação. As etapas do seu trabalho são divididas em identificação (levantamento), análise e avaliação de riscos, e finalmente o tratamento através de transferência (seguros, contratos, etc.) ou financiamento (provisões e fundos) dos riscos . 

No que diz respeito a seguros, apenas 20% do total de apólices de Condomínios e Residências é feito no Estado do Rio de Janeiro, não havendo discriminação por municípios. Além disso, muito raramente se contrata coberturas de alagamentos e desmoronamentos. E ainda que se contrate estas coberturas varia conforme a seguradora, o contrato onde há cobertura com abrangência para efeitos das águas de chuva. Portanto, não vejo relevante prejuízos nesse tipo de seguro. Considerando os seguros de automóveis, a maioria das seguradoras cobre veículos estacionados (era madrugada no acidente) em caso de enchentes. Temos segurados aproximadamente (dados de 2009) 9.784 carros em Friburgo, 17.414 em Petrópolis, 10.628 em Teresópolis e 215 em Sumidouro. Estimando que a perda foi de 80% em Friburgo e Sumidouro, e de 20% em Petrópolis e Teresópolis, e que o custo médio para consertar estes veículos na região é de R$ 7 mil, a estimativa dessa perda é de R$ 95 milhões. Há ainda o seguro de vida, num cenário de aproximadamente 600 vítimas fatais – uma vez que quase todos os sindicatos exigem isso em sua convenção coletiva de trabalho – considerando uma cobertura mínima de R$ 10 mil e que muitas pessoas possuem coberturas maiores enquanto outras não tem seguro, o total do prejuízo estimado alcança R$ 6 milhões. Os seguros empresariais das indústrias de Friburgo, do comércio em toda a região, dificilmente encontra cobertura de seguros, devido a rara contratação de cobertura para enchentes e desabamentos. Concluo, portanto, que o total de perdas seguradas se aproxime de R$ 100 milhões

Não há como se mensurar um número exato e definitivo para essa catástrofe. Mas somando-se as perdas de lucros com turismo (principal indústria da região) de aproximadamente R$ 60 milhões, as perdas seguradas de R$ 100 milhões, as estimativas dos prefeitos de R$ 2 bilhões para equipamentos públicos e remoção de desabrigados, podemos imaginar a magnitude do prejuízo – considerando ainda outros mercados dos setores primário e secundário, bem como os danos ainda ocultos – se aproximando dos R$ 3 bilhões.  

7) O que faz um gerente de riscos?

O gerente de risco é como um médico generalista, ele coordena uma equipe de profissionais de diferentes setores e especialidades, com objetivo de traçar prioridades, através de técnicas matemáticas e estatísticas que indiquem frequência e severidade dos riscos estudados, para indicar um plano ótimo de ação que reduza os riscos e suas consequências. O gerente de risco pode ser um administrador, economista, advogado, médico, engenheiro, entre outros. O mais comum é se encontrar engenheiros, administradores e economistas atuando nessa área. Não há um curso específico, mas uma especialização em gerenciamento de riscos.

Por Gustavo Cunha Mello

Prof. Gustavo Cunha Mello, Economista, com MBA em Gerenciamento de Riscos pela COPPE-UFRJ, Pós Graduação em Engenharia de Planejamento pela COPPE-UFRJ e Mestrado em Engenharia de Produção – Sistemas de Gestão pelo Latec-UFF. Gerente de Riscos, Corretor de Seguros, Perito Judicial e Investigador de Acidentes. Professor desde 2000 da Escola Nacional de Seguros – Funenseg – nos cursos técnicos e no MBA de seguros. Também é professor da UFF e do IBMEC nos MBAs de gerenciamento de riscos e gestão de projetos (PMBOK). Membro de Comitês na ABNT. Trabalha há 30 anos no setor de seguros e na consultoria de gerenciamento de riscos. Tendo concluído diversos cursos de seguros e análise de riscos no Brasil e no exterior através do AICPCU/IAA - American Institute for Chartered Property Casualty Underwriters and the Insurance Institute of America - Malvern - Pennsylvania, bem como cursos de Resseguros executados no Lloyds de Londres pelo CII – Chartered Insurance Institute. É articulista de diversas mídias especializadas em seguros e gerenciamento de riscos, bem como da Globonews e Bandnews na área de gerenciamento de riscos.

2 respostas em “Perguntas e Respostas sobre catástrofes das Tempestades Tropicais ( Chuvas )”

Não tem curso específico para um gerente de riscos? E o atuário faz o que? “através de técnicas matemáticas e estatísticas que indiquem frequência e severidade dos riscos estudados, para indicar um plano ótimo de ação que reduza os riscos e suas consequências” Isso parece ser exatamente uma das atividades que o atuário realiza.

Marcelo,
O atuário utiliza basicamente modelos estatísticos, o gerente de risco não necessariamente. O atuário se destina a planos previdenciários, seguradoras entre outras tarefas. O gerente de risco se destina a evitar sinistros. Algumas ferramentas tem muita convergência, mas os destinos e métodos são bastante diferentes.
Infelizmente gerenciamento de riscos não é uma faculdade como atuária ou estatística, mas uma especialização.
Um abraço
Gustavo

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